A obra ‘Canto XXVII: Um diabo lógico’, de Salvador Dalí, em mostra na Caixa Cultural
Caixa Cultural expõe a partir desta terça cem gravuras criadas pelo pintor surrealista para ilustrar o clássico ‘A divina comédia’
RIO - De homens desfigurados e aberrações perturbadoras em tons pastéis a imagens serenas, já em alegres tons de azul, vermelho e amarelo. Salvador Dalí (1904-1989) pintou em aquarela a sua versão de "A divina comédia", obra-prima de Dante Alighieri (1265-1321). Criou, ao todo, cem ilustrações que compõem a mostra "Dalí: A Divina Comédia", que a Caixa Cultural do Rio abre ao público hoje.Dalí começou a criar as ilustrações do poema épico a convite do governo italiano. A ideia então era comemorar os 700 anos do clássico — a data de conclusão de "A divina comédia" é incerta e estima-se que a primeira parte, "Inferno", teria sido concebida por volta de 1304.
RIO - De homens desfigurados e aberrações perturbadoras em tons pastéis a imagens serenas, já em alegres tons de azul, vermelho e amarelo. Salvador Dalí (1904-1989) pintou em aquarela a sua versão de "A divina comédia", obra-prima de Dante Alighieri (1265-1321). Criou, ao todo, cem ilustrações que compõem a mostra "Dalí: A Divina Comédia", que a Caixa Cultural do Rio abre ao público hoje.Dalí começou a criar as ilustrações do poema épico a convite do governo italiano. A ideia então era comemorar os 700 anos do clássico — a data de conclusão de "A divina comédia" é incerta e estima-se que a primeira parte, "Inferno", teria sido concebida por volta de 1304.
Polêmica na Itália.
A encomenda causou polêmica na época: por que um artista espanhol deveria ilustrar o livro do célebre autor italiano? O pedido foi desfeito, mas Dalí seguiu com o trabalho, que vem ao Rio pela primeira vez, como afirma o idealizador da mostra, Rodolfo de Athayde.
As obras são dos colecionadores Julio Coscolla Gordo e Maribel Arévalo García, de Madri. Os dois nunca haviam exposto o acervo e foram convidados por Athayde a ceder os trabalhos para exposições no Brasil. Depois do Rio, a coleção deve viajar ao Recife e a Juiz de Fora. O produtor negocia ainda levar as obras para Belo Horizonte e Curitiba.
Dalí começou com aquarelas até decidir transformá-las em gravuras, reprodutíveis e mais apropriadas para acompanharem as edições de livros. Para chegar às nuances de cores e à precisão que buscava, pediu ajuda aos gravadores Raymond Jacquet e Jean Taricco. Os dois criaram 35 placas com 3.500 blocos xilográficos. A tiragem inicial foi de 500 exemplares — a que vem ao Rio é a edição de número 283.
— Um dos donos da coleção (Julio Coscolla Gordo) é um marinheiro, que já deu a volta ao mundo algumas vezes. Conversamos numa dessas viagens quando ele estava no Rio, e, embora relutante, ele aceitou ceder as obras. Estavam de fato guardadas na casa dele em Madri, e nos espantamos com a ótima qualidade delas — conta Athayde.
Nos anos 1960, as gravuras de Dalí ilustraram os seis volumes da obra completa de Dante Alighieri numa edição feita na França. No Rio, o percurso pela comédia dantesca aos olhos de Dalí começa pelo "Inferno", ilustrado por 34 gravuras que serão apresentadas com versos do autor italiano pinçados pelo artista quando da criação dos trabalhos, para acompanhá-los. A sala seguinte da exposição é dedicada ao "Purgatório", seguida, por fim, pelo ambiente do "Paraíso", com 33 imagens em cada um dos temas.
Como a tiragem inicial foi de 500 exemplares, não é raro ver os trabalhos em países da Europa, como afirma Athayde. No Brasil, ainda segundo ele, a única exposição com as cem ilustrações de Dalí para "A divina comédia" ocorreu há mais de dez anos, em Brasília.
— Existem ilustrações anteriores, como as de Boticelli, William Blake e Gustave Doré — explica Athayde. — Nas obras de Dalí, é possível perceber todo o conceito surrealista para criar uma obra diferente de todas as outras.
Além de se distinguirem das demais ilustrações para a obra-prima de Dante, os trabalhos de Dalí são bastante diferentes entre si, dado o longo período de produção, de quase uma década. Assim, uma caveira estendida, distorcida pelo traço de Dalí, parece dialogar com os relógios derretidos retratados pelo artista na célebre tela dos anos 1930 "A persistência da memória". É, aliás, no tema "Inferno", com a caveira distorcida, os homens desfigurados e as aberrações, que Dalí parece mais desenvolto, um tanto mais próximo das construções surrealistas. No "Purgatório", o homem já parece conseguir caminhar, mas ainda a duras penas. É então no "Paraíso" que Dalí brinca com anjos vestidos de azul ou imagens celestiais, mais figurativas e leves do que no restante do universo dantesco.
Fonte: O Globo/Cultura
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